domingo, 7 de março de 2010

Por detrás da tragédia!

Sei que muita gente falou sobre o Haiti desde o dia do terremoto que assolou o pequeno país!!!

Muitos falaram dos problemas enfrentados pelo Haiti, mas poucos foram às raízes históricas para entender o que se passava nesse país antes do grande terremoto!

Confesso que não entendia como o país era tão pobre, lógico que não entendia, nunca pesquisei sobre a triste história do Haiti!

Mas não vou me aprofundar muito. Vou falar de um texto que li durante a aula de "História e Cultura Afro-Brasileira", na faculdade.

O texto é "Os pecados do Haiti" por Eduardo Galeano.

"Em 1803 os negros do Haiti deram uma tremenda sova nas tropas de Napoleão Bonaparte e a Europa jamais perdoou esta humilhação infligida à raça branca." (Eduardo Galeano)

Como muitos devem saber (ou não), o Haiti foi a colônia mais rica e importante da França graças à exportação do açúcar, café e cacau e (claro) a exploração de seus escravos.

A colônia sofreu uma revolta de escravos e o Haiti foi o primeiro país, no mundo, a abolir a escravidão, isso em 1794.

Em 1803 os franceses foram expulsos da ilha, e em 1804 é declarada independência do Haiti!

A Europa se sentiu humilhada! Como "punição" pela liberdade conquistada, o Haiti foi submetido a um bloqueio comercial, ou seja, ninguém comprava, ninguém vendia e ninguém reconhecia a nova nação!!!!

Mais tarde foi assinado um tratado onde o Haiti teria que pagar 150 milhões de francos à França como indenização por ter a liberdade conquistada!


"O Haiti foi o primeiro país livre das Américas. Os Estados Unidos tinham conquistado antes a sua independência, mas meio milhão de escravos trabalhavam nas plantações de algodão e de tabaco. Jefferson, que era dono de escravos, dizia que todos os homens são iguais, mas também dizia que os negros foram, são e serão inferiores." (Eduardo Galeano)

Os Estados Unidos da (Liberdade e Igualdade) América invadiram o Haiti em 1915 sob o pretexto de proteger os interesses norte-americanos no país, e ficaram por lá até 1934.

"Os Estados Unidos invadiram o Haiti em 1915 e governaram o país até 1934. Retiraram-se quando conseguiram os seus dois objetivos: cobrar as dívidas do City Bank e abolir o artigo constitucional que proibia vender plantações aos estrangeiros. " (Eduardo Galeano)

Depois de um grande período de conturbação política, foram realizadas eleições livres em 1990, quem conseguiu a vitória foi Jean-Bertrand Arsistide. Em 1991, Aristide foi deposto em um golpe de Estado.


"Depois de haver posto e retirado tantos ditadores militares, os Estados Unidos retiraram e puseram o presidente Jean-Bertrand Aristide, que havia sido o primeiro governante eleito por voto popular em toda a história do Haiti e que tivera a louca idéia de querer um país menos injusto." (Eduardo Galeano)

O elevado número de refugiados do Haiti que tentavam ingressar em terras estadounidenses, fez aumentar a pressão dos EUA pela volta de Aristide.

Em maio de 1994, o Conselho de segurança da ONU decretou bloqueio total ao país. Em setembro do mesmo ano, os Estados Unidos entraram no Haiti para reempossar Aristide. Em outubro Ariste assume um país destroçado economicamente devido ao bloqueio comercial.

Entre 1994 e 2000, apesar do país já ter avançado com a eleição democrática, o país sofreu inúmeras crises, e com toda essa instabilidade foi impossível planejar e implantar reformas políticas. E no começo desse ano, o país foi assolado por um terremoto de 7,3 na escala Richter, e muitos não entendiam como o Haiti não tinha um planejamento para socorrer suas vítimas, eles nunca tiveram chance de melhorar!

Boa Noite!

Texto "OS PECADOS DO HAITI" por Eduardo Galeano

Agência Carta Maior

A democracia haitiana nasceu há um instante. No seu breve tempo de vida, esta criatura faminta e doentia não recebeu senão bofetadas. Era uma recém-nascida, nos dias de festa de 1991, quando foi assassinada pela quartelada do general Raoul Cedras. Três anos mais tarde, ressuscitou. Depois de haver posto e retirado tantos ditadores militares, os Estados Unidos retiraram e puseram o presidente Jean-Bertrand Aristide, que havia sido o primeiro governante eleito por voto popular em toda a história do Haiti e que tivera a louca idéia de querer um país menos injusto.

O voto e o veto

Para apagar as pegadas da participação estadunidense na ditadura sangrenta do general Cedras, os fuzileiros navais levaram 160 mil páginas dos arquivos secretos. Aristide regressou acorrentado. Deram-lhe permissão para recuperar o governo, mas proibiram-lhe o poder. O seu sucessor, René Préval, obteve quase 90 por cento dos votos, mas mais poder do que Préval tem qualquer chefete de quarta categoria do Fundo Monetário ou do Banco Mundial, ainda que o povo haitiano não o tenha eleito com um voto sequer.

Mais do que o voto, pode o veto. Veto às reformas: cada vez que Préval, ou algum dos seus ministros, pede créditos internacionais para dar pão aos famintos, letras aos analfabetos ou terra aos camponeses, não recebe resposta, ou respondem ordenando-lhe:

– Recite a lição. E como o governo haitiano não acaba de aprender que é preciso desmantelar os poucos serviços públicos que restam, últimos pobres amparos para um dos povos mais desamparados do mundo, os professores dão o exame por perdido.

O álibi demográfico

Em fins do ano passado, quatro deputados alemães visitaram o Haiti. Mal chegaram, a miséria do povo feriu-lhes os olhos. Então o embaixador da Alemanha explicou-lhe, em Port-au-Prince, qual é o problema:

– Este é um país superpovoado, disse ele. A mulher haitiana sempre quer e o homem haitiano sempre pode.

E riu. Os deputados calaram-se. Nessa noite, um deles, Winfried Wolf, consultou os números. E comprovou que o Haiti é, com El Salvador, o país mais superpovoado das Américas, mas está tão superpovoado quanto a Alemanha: tem quase a mesma quantidade de habitantes por quilômetro quadrado.

Durante os seus dias no Haiti, o deputado Wolf não só foi golpeado pela miséria como também foi deslumbrado pela capacidade de beleza dos pintores populares. E chegou à conclusão de que o Haiti está superpovoado… de artistas.

Na realidade, o álibi demográfico é mais ou menos recente. Até há alguns anos, as potências ocidentais falavam mais claro.

A tradição racista

Os Estados Unidos invadiram o Haiti em 1915 e governaram o país até 1934. Retiraram-se quando conseguiram os seus dois objetivos: cobrar as dívidas do City Bank e abolir o artigo constitucional que proibia vender plantações aos estrangeiros. Então Robert Lansing, secretário de Estado, justificou a longa e feroz ocupação militar explicando que a raça negra é incapaz de governar-se a si própria, que tem “uma tendência inerente à vida selvagem e uma incapacidade física de civilização”. Um dos responsáveis da invasão, William Philips, havia incubado tempos antes a ideia sagaz: “Este é um povo inferior, incapaz de conservar a civilização que haviam deixado os franceses”.

O Haiti fora a pérola da coroa, a colônia mais rica da França: uma grande plantação de açúcar, com mão-de-obra escrava. No Espírito das Leis, Montesquieu havia explicado sem papas na língua: “O açúcar seria demasiado caro se os escravos não trabalhassem na sua produção. Os referidos escravos são negros desde os pés até à cabeça e têm o nariz tão achatado que é quase impossível deles ter pena. Torna-se impensável que Deus, que é um ser muito sábio, tenha posto uma alma, e sobretudo uma alma boa, num corpo inteiramente negro”.

Em contrapartida, Deus havia posto um açoite na mão do capataz. Os escravos não se distinguiam por sua vontade de trabalhar. Os negros eram escravos por natureza e vagos também por natureza, e a natureza, cúmplice da ordem social, era obra de Deus: o escravo devia servir o amo e o amo devia castigar o escravo, que não mostrava o menor entusiasmo na hora de cumprir com o desígnio divino. Karl von Linneo, contemporâneo de Montesquieu, havia retratado o negro com precisão científica: “Vagabundo, preguiçoso, negligente, indolente e de costumes dissolutos”. Mais generosamente, outro contemporâneo, David Hume, havia comprovado que o negro “pode desenvolver certas habilidades humanas, tal como o papagaio que fala algumas palavras”.

A humilhação imperdoável

Em 1803 os negros do Haiti deram uma tremenda sova nas tropas de Napoleão Bonaparte e a Europa jamais perdoou esta humilhação infligida à raça branca. O Haiti foi o primeiro país livre das Américas. Os Estados Unidos tinham conquistado antes a sua independência, mas meio milhão de escravos trabalhavam nas plantações de algodão e de tabaco. Jefferson, que era dono de escravos, dizia que todos os homens são iguais, mas também dizia que os negros foram, são e serão inferiores.

A bandeira dos homens livres levantou-se sobre as ruínas. A terra haitiana fora devastada pela monocultura do açúcar e arrasada pelas calamidades da guerra contra a França, e um terço da população havia caído no combate. Então começou o bloqueio. A nação recém nascida foi condenada à solidão. Ninguém comprava do Haiti, ninguém vendia, ninguém reconhecia a nova nação.

O delito da dignidade

Nem sequer Simón Bolívar, que tão valente soube ser, teve a coragem de firmar o reconhecimento diplomático do país negro. Bolívar conseguiu reiniciar a sua luta pela independência americana, quando a Espanha já o havia derrotado, graças ao apoio do Haiti. O governo haitiano havia-lhe entregue sete naves e muitas armas e soldados, com a única condição de que Bolívar libertasse os escravos, uma idéia que não havia ocorrido ao Libertador. Bolívar cumpriu com este compromisso, mas depois da sua vitória, quando já governava a Grande Colômbia, deu as costas ao país que o havia salvo. E quando convocou as nações americanas à reunião do Panamá, não convidou o Haiti mas convidou a Inglaterra.

Os Estados Unidos reconheceram o Haiti apenas sessenta anos depois do fim da guerra de independência, enquanto Etienne Serres, um gênio francês da anatomia, descobria em Paris que os negros são primitivos porque têm pouca distância entre o umbigo e o pênis. A essa altura, o Haiti já estava em mãos de ditaduras militares carniceiras, que destinavam os famélicos recursos do país ao pagamento da dívida francesa. A Europa havia imposto ao Haiti a obrigação de pagar à França uma indemnização gigantesca, a modo de perda por haver cometido o delito da dignidade.

A história do assédio contra o Haiti, que nos nossos dias tem dimensões de tragédia, é também uma história do racismo na civilização ocidental.


3 comentários:

  1. Bom, não quis analisar sobre o aspecto "raça" "racismo" pois o post ficaria muito extenso!

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  2. Bah Jú, bem interessante! Futura historiadora!!!

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  3. Interessante o texto! Gostei!
    Beijos

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